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Paulo Cesar Fernandes

Nova Lei da Pesquisa Clínica no Brasil

Nova lei deve impulsionar a pesquisa clínica no Brasil

Por Paulo Fernandes, consultor, membro do conselho da Aliança Brasileira de Pesquisa Clínica





O maior país da América Latina, o Brasil oferece pontos fortes únicos, como a sua população diversificada, recrutamento eficiente de pacientes e dados de alta qualidade, que o tornam um local muito atrativo para a realização de ensaios clínicos. Com as recentes melhorias na legislação e nos quadros regulamentares, o Brasil irá reforçar ainda mais o seu papel e o da América Latina no panorama global da investigação clínica.


O efeito da Lei Brasileira de Pesquisa Clínica 14.874/24


Aprovada pelo presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva em maio de 2024 e entrando em vigor em 90 dias após a aprovação, a Lei 14.874/24 visa agilizar o processo de avaliação de ensaios clínicos, reduzir obstáculos burocráticos e melhorar a previsibilidade da avaliação, principalmente em relação aos prazos. Ao proporcionar um caminho regulatório mais claro e eficiente, a lei pode atrair mais investimentos e incentivar a inovação no setor, tanto de empresas farmacêuticas e biotecnológicas globais quanto locais. As melhorias esperadas nos prazos tornarão o Brasil um local ainda mais atrativo para ensaios clínicos globais. A lei estabelece que a Autoridade Reguladora Brasileira terá 90 dias úteis para responder aos pedidos de ensaios clínicos; simplifica o processo de revisão ética, contando apenas com a revisão das comissões de ética locais para que os ensaios possam ser iniciados e acrescenta aos regulamentos existentes regras mais claras que melhoram diretamente a viabilidade do país.


Defesa da pesquisa clínica


A nova lei é apoiada pela bem estruturada associação brasileira de CROs, a ABRACRO, que tem apoiado o ecossistema de pesquisa clínica nos últimos 18 anos. Recentemente, a ABRACRO tem defendido melhores marcos regulatórios e promovido o desenvolvimento da força de trabalho de ensaios clínicos no país. A ABRACRO assumiu um papel proativo na promoção da discussão pública sobre a nova lei, promovendo interações com reguladores da ANVISA, comitês de ética centrais e locais, bem como outras associações setoriais, como o Sindusfarma (Associação da Indústria Farmacêutica), a Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), o Grupo Farma Brasil (Associação da Indústria Farmacêutica de Capital Nacional e Pesquisa) e a Abiquifi (Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica - focada em IFAs).


Há cerca de sete anos, a ABRACRO criou seu primeiro curso de extensão sobre condução de pesquisa clínica e vem promovendo esses cursos dentro do ecossistema. Essa iniciativa apoia o ingresso de novos profissionais e o treinamento e reciclagem daqueles que já atuam na área de ensaios clínicos. Além disso, parte destes cursos é oferecida a profissionais provenientes de instituições públicas, gratuitamente ou com descontos, para apoiar a sua atualização, o que melhora a qualidade geral da prestação de serviços com base num conhecimento mais profundo da ética, das suas funções individuais, etc. As empresas associadas e os esforços da associação construíram uma base sólida para o futuro.


Diversidade e recrutamento continuam a ser os principais pontos fortes do Brasil


A vantagem mais significativa do Brasil em matéria de ensaios clínicos tem sido tradicionalmente a capacidade do país para acelerar a velocidade de registo em ensaios clínicos globais, permitindo frequentemente que o tempo gasto durante a fase regulamentar (ao abrigo da antiga estrutura) seja recuperado com um registo rápido. O registo positivo é o resultado de uma série de factores combinados, incluindo a forte relação entre os médicos do estudo e os seus doentes, um país em que o acesso aos tratamentos tecnológicos mais recentes e avançados ainda não está generalizado e a procura colectiva de melhores cuidados de saúde para todos. Combinado com a exigência contínua das entidades reguladoras, incluindo a FDA através do seu documento de orientação Enhancing the Diversity of Clinical Trial Populations - Eligibility Criteria, Enrollment Practices, and Trial Designs Guidance for Industry, datado de novembro de 2020, no sentido de uma maior diversidade de inscrições, este potencial melhora a atratividade do país para os ensaios clínicos.


Com uma vantagem significativa em termos de diversidade populacional, mais de 50% da população do Brasil tem múltiplas origens étnicas, 61% da sua população está concentrada em áreas urbanas, com quase 40 cidades com mais de 500 000 habitantes, e um elevado índice global de adoção tecnológica coloca o Brasil como o primeiro país da América Latina, de acordo com o Ranking Mundial de Competitividade Digital do IMD para 2022. Os dados sobre o peso global das doenças no país estão em consonância com os dados globais, sendo a oncologia uma das doenças mais prevalecentes atualmente, uma tendência triste mas crescente.


A diversidade populacional permite que os investigadores recolham dados mais abrangentes e fiáveis, o que é crucial para o desenvolvimento de novos tratamentos e intervenções médicas que apoiem a introdução de produtos mais seguros no mercado, servindo mais rapidamente um maior número de doentes. Ao recrutar eficientemente pacientes de várias origens demográficas, os ensaios clínicos no Brasil podem produzir resultados inclusivos e abrangentes, beneficiando os resultados globais de saúde.


Dados e centros de alta qualidade


Os centros de ensaios clínicos brasileiros mantêm padrões elevados e cumprem rigorosamente os protocolos, o que resulta na produção de dados de alta qualidade. O país dispõe de uma rede de centros de investigação bem equipados, com profissionais experientes, e continua a melhorar a sua capacidade de formar novos profissionais para a investigação clínica. Esta infraestrutura existente apoia a execução de ensaios clínicos complexos, garantindo resultados fiáveis e precisos.


O Brasil tem um longo historial em várias áreas terapêuticas e assistiu recentemente a um aumento do número de ensaios clínicos de terapia celular e genética. A ANVISA, autoridade regulatória do país, tem desempenhado um papel crucial na regulamentação da avaliação e implementação de tais tecnologias que acabam ajudando os pacientes, por exemplo, com a publicação em 2020 da Resolução da Diretoria Colegiada - RDC no. 338 exclusivamente sobre Medicamentos de Terapias Avançadas ou sua publicação em 2023 de um documento de orientação específico para o setor chamado Guia de considerações sobre estudos de biodistribuição não clínicos com produtos de terapia gênica - Guia 70/2023 - versão 1 além de múltiplos webinars e reuniões com o setor regulado para discutir os avanços no campo e seus regulamentos.


Setor de pesquisa clínica em expansão na América Latina


As mudanças vão além do Brasil, destacando o potencial da América Latina como um todo. Os recentes desenvolvimentos na Argentina demonstram o potencial crescente da investigação clínica na região. A Argentina registou um crescimento significativo nos ensaios clínicos, com um aumento de 79% no número de ensaios entre 2017 e 2021 e um aumento de 130% no investimento em I&D clínica durante o mesmo período, de acordo com a associação local de empresas farmacêuticas e CRO, CAEME/CAOIC. Este crescimento resultou de mudanças governamentais efectuadas há alguns anos, que promoveram um ambiente regulamentar menos burocrático, mais previsível e mais rápido.


Além disso, a Colômbia e o México também desempenham papéis importantes no panorama da investigação clínica na América Latina. Ambos os países possuem inúmeros locais de investigação clínica com infra-estruturas robustas, permitindo um recrutamento eficiente de participantes em várias áreas terapêuticas, incluindo medicina interna, vacinas e oncologia, entre outras. Na Colômbia, com mais de 50 milhões de habitantes, existem mais de 130 centros de investigação clínica activos que receberam inspecções directas de BPC da INVIMA, a sua autoridade reguladora. O México fez progressos significativos no alinhamento do seu quadro regulamentar com as normas internacionais, particularmente através da sua participação ativa em iniciativas como o Conselho Internacional para a Harmonização de Requisitos Técnicos para Produtos Farmacêuticos para Uso Humano (ICH). Este alinhamento melhorou a qualidade e a fiabilidade dos dados dos ensaios clínicos, promovendo uma maior confiança entre patrocinadores e investigadores.


Os centros existentes na Colômbia e no México, apoiados por profissionais experientes e um enfoque crescente na conformidade regulamentar, aumentam ainda mais o atrativo da região como local para ensaios clínicos. As melhorias associadas às capacidades existentes e os resultados históricos positivos nas inspecções regulamentares demonstram o potencial da América Latina para se tornar um importante centro de investigação clínica, oferecendo um ambiente atrativo para ensaios clínicos globais e investimento em inovação.


Conclusão


O Brasil está na vanguarda da investigação clínica, oferecendo grandes vantagens, tais como uma população diversificada, dados de alta qualidade e recrutamento eficiente de doentes. Os recentes avanços legislativos consolidam ainda mais as novas possibilidades do Brasil. À medida que essas mudanças entram em vigor, podemos esperar impactos positivos significativos no cenário da pesquisa clínica no Brasil, tornando-o um local ainda mais atraente para a realização de pesquisas médicas de ponta. Com o crescimento simultâneo em países como a Argentina, a oportunidade para a pesquisa clínica em toda a América Latina se expandirá, apresentando um futuro promissor para a contribuição da região para os avanços da saúde global.


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